Prepare suas fórmulas: Laboratório P&B completo com 8 reagentes

Não é tão difícil quanto possa parecer preparar fórmulas para uso em um laboratório de fotografia preto e branco. Se você gosta de fotografar com câmeras analógicas e está enviando seus filmes para um laboratório externo ou comprando fórmulas prontas de grandes fabricantes como Kodak, Ilford, Adox, Tetenal e outros, você encontrará neste artigo alguns pontos a considerar em uma avaliação sobre passar, no todo ou em parte, a utilizar fórmulas preparadas em casa.

Tanto para filmes como para papéis o processamento no laboratório tem 3 fases em que o material é banhado em:

  1. Revelador
  2. Interruptor
  3. Fixador

Depois disso é apenas lavagem em água. Não vou entrar aqui no detalhe do que faz cada banho pois se você está pensando em preparar suas próprias químicas já deve com certeza saber o que faz cada uma delas. Existem passos/processos suplementares como eliminador de fixador, revelador em dois banhos, rebaixamento, viragem, etc, etc. Mas a ideia aqui é justamente explorar o quanto o processo pode ser simples.

Os reagentes são vendidos normalmente em frascos de vidro ou de um plástico mais robusto com tampas que fecham bem. Desconfie de fornecedores que enviam embalagens precárias, sacos plásticos por exemplo, pois o cuidado no manuseio e boas condições de armazenamento são fundamentais e indicativos da qualidade do que está dentro da embalagem.

Agitador magnético

Antes de começar a falar do preparo das fórmulas, quero incentivar você a construir um agitador magnético como esse da foto acima. Ele facilita enormemente a tarefa de misturar da forma correta os reagentes. Quando se faz com o bastãozinho de vidro e comum que a pessoa perca a paciência e jogue uma quantidade maior de reagente na água e isso compromete a dissolução que deve ser feita lentamente. O agitado é muito fácil de fazer e custa muito pouco. Vale a pena o esforço inicial para não ter mais trabalho depois. Siga este link.

1 – Revelador D23 para filmes

Existem reveladores que possuem uma forma concentrada, de estoque, que é diluída para utilização no que se chama de solução de uso ou de trabalho. Existem outros que são preparados diretamente em solução de trabalho. A proposta aqui é utilizar um revelador do segundo grupo que foi formulado pela Kodak: o D23. Esse é um revelador que utiliza apenas 2 reagentes: Metol e Sulfito de Sódio Anidro diluídos em água. O ideal é que seja preparado o mais próximo possível da revelação (nunca testei mais 1 hora após o preparo). Assim como a maioria dos reveladores para filmes, a boa prática manda que a solução de trabalho seja descartada após seu uso. Dessa forma, apenas a quantidade necessária para uma sessão deve ser preparada. Você armazena apenas os reagentes em pó e por isso não se preocupa com vencimento (em geral longo) ou mudanças rápidas nas características dos mesmos.

A fórmula é a seguinte:

Metol 7,5 g
Sulfito de Sódio Anidro 100g
Água até 1 litro

Preparo

Inicia-se com 750 ml de água aquecida a 52ºC. Acrescenta-se lentamente o Metol equanto se agita a solução com um bastão de vidro ou agitador magnético. Quando o Metol estiver perfeitamente dissolvido, faz-se o mesmo com o Sulfito de Sódio. Para finalizar, deve-se completar com água até 1000 ml ( 1 litro). Pode-se utilizar gelo em vez de água para acelerar o resfriamento.

É muito conveniente se utilizar uma balança digital com 3 casas decimais, isto é, que vá até milésimos de gramas, pois para se revelar apenas um filme 135 a quantidade de Metol fica muito reduzida e portanto sujeita a variações percentuais importantes em balanças com precisão menor. Essas balanças encontram-se hoje no comércio online a preços muito razoáveis.

Eu utilizo sempre copinhos e colheres de café descartáveis. No início eu jogava fora após cada medida, mas depois, com dor na consciência, comecei a lavar para não fazer lixo. Lavo logo após a preparação e não notei diferença alguma quando a contaminação ou diferença de performance. Quando o plástico começa a ficar muito riscado e gasto, só então eu descarto.

Evito retornar reagente em pó ao frasco adicionando quantidades mínimas para chegar, sem ultrapassar, a massa desejada. Uma balança com milésimos de grama não irá muito além de 20 ou 30 g de capacidade máxima. Considere então adquirir também uma outra até 500g e precisão de décimos de grama.

Fórmula do D23 para diversos volumes:

1 litro 400 ml 300 ml 250 ml
Metol 7,50 g 3,00 g 2,25 g 1,88 g
Sulfito de Sódio Anidro  100,0 g 40,0 g 30,0 g 25,0 g

 

Utilização

É preciso testar sempre. Com fórmulas preparadas em casa isso é ainda mais importante pois estão mais sujeitas a variações por conta das quantidades pequenas e falta de um controle de qualidade sobre os reagentes a fim de manter um padrão. A água é muito importante. Normalmente água de torneira serve, mas deve ser filtrada. O ideal é um deionizador que pode ser um desses usados em aquários. Mas isso pode ficar para uma segunda fase. Encontrando problemas persistentes pode ser interessante se fazer um teste com água destilada, ou sem íons, desmineralizada, para verificar se é essa a causa. Por um longo tempo utilizei água simplesmente filtrada, depois coletada de ar-condicionado, e hoje uso um desmineralizador. Quando a água é boa pode-se observar que os químicos se dissolvem mais facilmente e deixam uma solução límpida. Dificuldade em dissolver pode ser um primeiro sintoma de água com problemas.

Um ponto de partida para o D23 seria algo entre 8 e 10 minutos a 20ºC com filmes entre ASA 100 e 400. Agitação no primeiro minuto e depois 5s a cada minuto.

Rendimento

O grande inconveniente do revelador parece ser mesmo a necessidade de se preparar a solução de trabalho diretamente pois não há como se fazer um D23 concentrado. Após o preparo ele se degrada em algumas horas então é preciso prepará-lo momentos antes da utilização. É por esse motivo que, mesmo sendo uma ótima fórmula, ele não pode ser comercializado.

Por essas características, idealmente, o D23 é um revelador que deve ser descartado após cada revelação e forçosamente após uma sessão de trabalho. Eu sempre usei como one shot, descartando após cada filme ou chapa. Mas acredito que seja possível passar mais de um filme desde que se utilize uma quantidade não muito  limitada no tanque ou bacia. É preciso testar.

Características

O D23 é considerado um revelador de grão-fino e isso pode ser muito interessante para quem utiliza pequeno e médio formato. O metol é um agente revelador enérgico e isso significa que contrastes maiores apenas são obtidos com tempos mais longos. Normalmente ele tende mais a desenvolver as sombras tanto quanto as altas luzes e por isso tem um contraste mais para moderado. Eu já tive ótimos resultados em fotos externas em dias ensolarados e também em fotos urbanas noturnas quando o contraste do assunto é muito grande. Embora seja muito simples, nem por isso é um revelador de segunda linha. Ansel Adams o utilizava bastante e em diversas oportunidades fez muito elogios à sua perfomance.  Literatura a respeito pode ser encontrada no Formulário Fotográfico , de Reinhard Viebig, e no livro The Negative de Ansel Adams.

1.1 – Parodinal

Um outro revelador muito prático de se fazer e usar, com características complementares ao D23 é o Parodinal. Enquanto que o D23 é um revelador que tende a apresentar contraste mais controlado e grão fino, o Parodinal é mais contrastado, tem uma acutância mais pronunciada e gera grãos maiores. Mas ainda é um revelador universal que se dá muito bem em diversas situações. Ele tem um tempo de guarda enorme na forma concentrada. Há uma página só para ele aqui no site. Siga este link: Parodinal.

2 – Revelador Kodak D72 para papéis

Aparentemente não existe um revelador tão simples quanto o D23 para papéis. É muito conveniente, no caso de papéis, se trabalhar com solução de estoque que apenas se dilui no momento do uso . Um agente anti-véu é também muito desejável. São necessidades assim que fazem com que o número de reagentes aumente para 5 se escolhermos o D72. Ele é um revelador que dá tons negros puros em papéis de Brometo (salvo aviso em contrário, todos os papéis disponíveis hoje em dia caem na categoria Brometo de Prata). Sua fórmula aparece no já citado Formulário Fotográfico e é a seguinte:

Água 750 ml
Metol 3 g
Sulfito de Sódio Anidro 45 g
Hidroquinona 12 g
Carbonato de Sódio Anidro 67 g
Brometo de Potássio 2 g
Água para completar 1 litro

Preparo e utilização

Aquecer a água até algo como 50ºC e dissolver, um a um, os reagentes na ordem indicada. Viebig indica para diluir essa solução de estoque em: 1 parte revelador + 4 partes de água para se obter a solução de trabalho.

Esse é o único revelador de papéis que eu uso há muitos anos e achei que para meu caso a diluição 1+3 é mais adequada. Não faço controle de temperatura de revelação em papéis e no verão acontece às vezes da banheira chegar a 28ºC. Compenso essa temperatura elevada apenas no tempo de exposição no ampliador e isso tem dado certo.

A presença de ar no frasco, e consequente oxidação do concentrado, é um inimigo dos reveladores. Para minimizar esse efeito é bom se evitar frascos com muito ar no seu interior. Isso fica difícil se um frasco de 1 litro for utilizado e a solução estiver com o nível reduzido pelo consumo. Pode-se contornar essa situação fracionando-se o revelador logo após o seu preparo. Eu utilizo 8 vidrinhos âmbar de 125 ml cada que ficam cheios e bem fechados. Para fazer uma sessão de ampliações, uso o próprio vidrinho para dosar a proporção de 1 de revelador +3 de água e preparo assim 1/2 litro de solução de trabalho. Isso é suficiente para a banheira de 24 x 30 cm que normalmente utilizo.

Rendimento

Amplio até umas 10 cópias com meio litro de solução de trabalho e caso vá fazer mais eu dou um reforço ou preparo novo. Porém, isso é mais por conta de não querer arriscar o papel que anda muito caro. Não há um efeito muito notável de performance do revelador até esse ponto de utilização. Talvez dê para ir muito além. É preciso testar

3 – Interruptor

O mais comum é o interruptor com Ácido Acético. Este pode ser comprado na forma Ácido Ácetico Glacial que apresenta uma pureza próxima dos 100%, enquanto que o que se chama simplesmente de Ácido Acético, é a sua solução a 28%. É o mesmo banho tanto para filmes como para papéis. Nos livros de fotografia, como nos citados logo acima, recomenda-se algo como uma solução a 2% de Ácido Acético Glacial (20g/litro, em Viebig) ou Ácido Acético a 4,5 % em volume (45ml/litro, em Adams). Essas concentrações são pensadas para interruptores que serão reutilizados. Na prática, para um laboratório caseiro, onde as quantidades processadas são geralmente pequenas e as sessões mais ocasionais, eu recomendo , no caso de filmes, uma concentração bem menor e o descarte do banho interruptor logo após o uso. No caso de papéis faz-se a solução mais forte e esta é guardada e reutilizada por um certo número de cópias. Seria algo assim:

filmes 4 ml de Ácido Acético Glacial
ou
14 ml de Ácido Acético
1 litro de água
papéis 20 ml de Ácido Acético Glacial
ou
70 ml de Ácido Acético
1 litro de água

O tempo de permanência fica entre 1/2 e 1 minuto. Papéis resinados (RC) já têm a ação do revelador interrompida em 1/2 minuto. Papéis de fibra devem ser deixados por 1 minuto. No caso de filmes, utilizando-se uma solução mais fraca, deixar 1 minuto inteiro é boa prática. Não há dano observável se estes tempos se alongarem um pouco em qualquer caso.

O Ácido Acético é muito desagradável pelo seu cheiro forte e ainda muito irritante para a pele e perigoso para olhos e mucosas. Pode ser substituído por outros ácidos mais amigáveis sem grande aumento de custo. É o caso do Ácido Cítrico que é apresentado em cristais e pode ser dissolvido na proporção de 20 g por litro de água para se fazer uma solução de trabalho.

Rendimento

Sobre a exaustão, o ideal seria medir o Ph com indicadores e reutilizar o banho enquanto estiver ácido. Na ausência do recurso, o melhor é descartar o banho depois de algo como 30 cópias 18 x 24 cm para se ter certeza de que não há revelador sendo carregado para o banho fixador. O inconveniente é exaurir o fixador antes da hora e ele custa bem mais caro que o interruptor.

4 – Fixador

O agente fixador clássico é o Hiposulfito de Sódio. Ele funcionaria sozinho mas sua solução não dura muito e por isso o banho deve ser acidulado para aumentar sua estabilidade e consequentemente sua durabilidade. Utiliza-se para tanto o Metabissulfito de Potássio. A fórmula fica então:

Hipossulfito de Sódio 250 g
Metabissulfito de Potássio 25 g
Água até 1 litro

Preparo

Aqueça 750 ml de água a aproximadamente 50ºC e adicione lentamente o Hipossulfito mexendo sem parar. Se você deixar acumular muitos cristais dentro da água a dissolução fica bem mais difícil. É mais produtivo realmente adicionar aos poucos, aproximadamente  na mesma velocidade em que acontece a dissolução. Faça o mesmo a seguir com o Metabissulfito.

Utilização

Este fixador pode ser utilizado tanto para papéis como para filmes. Como banheiras tendem a coletar pó e impurezas, considere filtrar de vez em quando a solução. Outra medida é fazer dois frascos, um para papéis/filmes em banheiras e outro para filmes em tanques. Este segundo tenderá a permanecer mais limpo.

Fala-se muito de fixadores com endurecedores que tornam a gelatina mais resistente à abrasão. Mas procedendo-se com cuidado em um laboratório caseiro, com pouco volume, o fixador comum resolve muito bem a questão.

Existem fixadores rápidos e eficientes à base de Tiossulfato de Amônia, mas esse reagente anda tão difícil de achar que não o estou considerando aqui.

Rendimento

A exaustão de um fixador dá sinais mais claros que o Interruptor. O filme começa mostrar restos de emulsão nas bordas, demoram mais para limpar completamente, e isso quer dizer que o banho precisa ser descartado. O mesmo acontece, com as devidas diferenças, nos papéis. Mas atenção, quando isso acontece é sinal que a hora de trocar já passou faz um certo tempo. Observe e procure fazer a renovação antes dessas situações críticas. Caso uma cópia ou filme apresente estes sinais no final da lavagem ou mesmo depois de secos, eles podem voltar para um fixador fresco. Eu passo umas 20 cópias 18×24 em um litro de fixador. Melhora muito você ter um agitador de banheira para dar mais eficiência ao processo. Já o fixador de filmes, eu acompanho o clareamento do filme e quando ele começa a ficar mais demorado eu troco o fixador. O fixador preparado em casa custa aproximadamente a metade dos que se encontram no mercado. Você pode conferir isso fazendo cotações e colocando os dados nesta calculadora.

5 – Os 8 reagentes e o que vem depois

Se você contar verá que foram citados:

  1. Metol – Agente revelador
  2. Hidroquinona – Agente revelador
  3. Sulfito de Sódio Anidro – conservador em reveladores
  4. Carbonato de Sódio Anidro –  acelerador nos reveladores
  5. Brometo de Potássio – retardador e clarificador nos reveladores
  6. Hipossulfito de Sódio – Agente fixador
  7. Metabissulfito de Potássio – Acidulante no fixador
  8. Ácido Acético – Interruptor

Esse seria então o kit inicial para um laboratório P&B completo. Se apenas filmes forem revelados para processamento posterior todo em digital, apenas 5 reagentes já dão conta. Com certeza existem outras opções para se começar, se você tiver alguma sugestão, contribuições são sempre bem vindas. Estou sugerindo esse kit pois são fórmulas que eu já utilizo há muitos anos.

Há uma certa flexibilidade nesse conjunto pois estes são reagentes muito clássicos da fotografia. Por exemplo, é possível se fazer o famoso Dektol da Kodak se em vez de 67g de Carbonato de Sódio Anidro se colocar 80g. É possível também se fazer um revelador universal, para filmes, com os mesmos ingredientes em outras proporções. Enfim, considere este um ponto de partida que irá abrir muitas possibilidades mas estes reagentes são uma espécie de obrigatórios em qualquer laboratório P&B.


Revelador Universal Metol-Hidroquinona

Água a 30ºC – 750 ml
Metol – 3 g
Sulfito de Sódio Anidro – 75 g
Hidroquinona – 11 g
Carbonato de Sódio Anidro – 75 g
Brometo de Potássio – 1 g
Água para completar 1 litro

Essa fórmula consta no Formulário Fotográfico de Reinhard Viebig (tenho a sétima edição, de 1985) onde ele diz o seguinte:

  1. Usado sem diluição, age muito rápido e dá um forte contraste, revela fotocópia, películas process e radiografias além de todo o material que se pretenda contraste.
  2. Para revelar-se películas ou chapas com o contraste normal, faz-se diluição de 1 por 5.
  3. Uma revelação suave se faz diluindo o revelador em 1 por 10 a 1 por 15.
  4. Para revelar papéis de contato (cloreto) diluir 1 por 2 ou 1 por 3 e revelar 45 segundos a 1 minuto [creio que não existem mais esses papéis].
  5. Para revelar papéis brometo e clorobrometo [esses são os papéis atuais em fibra ou RC], diluir de 1 por 5 a 1 por 7 e revelar de 1 ½ a 2 minutos.

Se você pesquisar verá que, com esses ou com o acréscimo de uns poucos reagentes, é possível se produzir um número enorme de fórmulas e suas variações. Os mais sábios recomendam focar e dominar uma única ou pouquíssimas fórmulas que funcionem bem para você em vez de ficar o tempo todo experimentando coisas novas. Acho esse conselho muito útil para profissionais que não podem brincar ou arriscar no resultado. Não é o meu caso, felizmente.

6 – Fornecedores

É um erro se pensar que apenas grandes clientes podem comprar da indústria química. Os fabricantes sim, estes são mais propensos a oferecer apenas em grandes quantidades e costumam se especializar em um número limitado de produtos. Mas existe um robusto mercado de distribuidores que compram e fracionam e vendem os reagentes em embalagens bem menores. Mesmo uma empresa grande tem normalmente um laboratório para testes e desenvolvimento onde quantidades pequenas são necessárias. É preciso procurar. No Brasil eu organizei uma pequena lista de fornecedores que já utilizei ou que foram recomendados por quem já os utilizou. Ela está na página home>referências>websites, ou acesse por aqui neste link. Novamente, se souber de algum outro que você possa recomendar, por favor compartilhe.

7 – Cuidados

Todo produto químico deve ser manuseado com cuidado. Mas há muita neurose a respeito de “produtos químicos” em geral nos dias de hoje – como se a natureza não estivesse toda na tabela periódica. Conheci um químico que lembrava que o sal de cozinha é essencial para o organismo e, ao mesmo tempo, um punhado de sal ingerido pode matar um adulto. Tenha em mente portanto que as reações a produtos químicos é dose dependente, isto é, depende do tempo e da quantidade à qual a pessoa é exposta. O grau de toxidade dos reagentes normalmente utilizados em fotografia somado ao grau de exposição do laboratorista amador demanda apenas as medidas de segurança mais básicas e fáceis de seguir. Alguns pontos a se ter em mente:

  1. Utilize instrumentos como colheres e copos descartáveis e se não os for descartar lave-os bem com esponja e detergente, logo após a utilização. O mesmo se aplica aos frascos onde você compra os reagentes. Eu costumo corta-los com um estilete antes de por no lixo para garantir que não serão aproveitados. A questão é que o frasco pode conter traços do reagente impregnado em suas paredes, mesmo depois de lavado, e esses traços podem reagir de modo imprevisível em uma nova utilização.
  2. Evite bagunça no laboratório. A maior parte dos acidentes, como o de frascos e copos derrubados, são fruto de bancada cheia de objetos que não pertencem à operação que está sendo feita. Limpe a área, ordene os frascos que serão utilizados, ordene os copinhos que irão servir para o fracionamento, coloque a balança em local de fácil acesso e livre de outros objetos. Tenha tudo que vai precisar já ao alcance das mãos para nem precisar se mexer do lugar enquanto prepara sua fórmula. Afaste cães, gatos, crianças e outros seres vivos. Use um becker de vidro que é mais estável e próprio para fazer as misturas. Aqui não é bom improvisar com potes de sorvete, garrafas pet de refrigerantes e coisas do gênero. Tenha água corrente ao alcance. Organizar o local de trabalho é a medida de segurança mais efetiva, na minha opinião, pois fazendo isso todos os seus movimentos transcorrerão dentro de um padrão previsto para dar certo.
  3. No momento de preparar soluções de estoque, quando os reagentes no estado puro são manuseados, luvas, óculos e máscara para pó e vapores constituem o melhor da proteção. Cuidado com a manga da camisa ou avental.
  4. Verter um reagente de um frasco a outro desprende para o ar partículas menores do reagente que podem ser facilmente inaladas. Se agitar um frasco com reagente em pó para que ele fique mais solto e fácil de pegar, espere pelo menos 5 minutos para que a poeira no seu interior se assente e mesmo assim use uma máscara nesses momentos.
  5. Já com as soluções de trabalho a situação é bem mais tranquila. Muitos fotógrafos do passado nem mesmo pinças utilizavam. No livro do Ansel Adams há uma sequência de fotos sobre revelação de várias chapas de filmes em banheira na qual vemos o laboratorista, sem luvas, com as mão dentro do revelador.

    The Negative – Alsel Adams – pag 208

    As concentrações nas soluções de trabalho são muito baixas e apenas pessoas alérgicas a um ou outro reagente é que apresentarão algum problema imediato pela exposição. Mas mesmo assim a precaução não faz mal a ninguém. Evite tocar nos banhos fotográficos. Para papéis use pinças, para filmes em rolo use tanques e para filmes em chapas film hangers ou processe um a um em banheiras. É possível se acostumar a uma rotina de trabalho em que você não toca nos banhos fotográficos.

  6. Conheça os reagentes. Uma rápida pesquisa na internet é muito útil para você ter uma ideia das características físicas, toxidade e perigos dos reagentes que utiliza. A Wikipedia é uma boa fonte para isso pois os reagentes são todos muito conhecidos da química e utilizados em diversos outros fins além da fotografia. Alguns são bem inofensivos e outros são mais perigosos se manuseados sem cuidados. Para se aprofundar procure por “Ficha de Informações de Segurança de Produtos Químicos – FISPQ” mais o nome do reagente. Se você lê inglês procure por MSDS mais o nome do reagente em inglês. Alguns sites como o bostick-sullivan, fornecedor de materiais e equipamentos para fotografia, tem logo na home page um link para Safety Data Sheets com muitas informações interessantes. Outro com descrições breves mas muito úteis é o Jack’s Photographic and Chemestry Site.

Acima, preparação para fazer D72. Todos os reagentes alinhados na ordem em que irão entrar na fórmula. Todos com seus próprios copinhos e colheres no tamanho adequado. A balança da direita tem precisão de milésimos de grama, vai até 20 g  e serve para, nessa fórmula, pesar Metol, Hidroquinona e Brometo de Potássio. A balança da direita tem precisão de décimos de grama, vai até 500 g e serve para o Sufito de Sódio e Carbonato de Sódio. Faço essa dosagem na bancada seca e somente as quantidades já pesadas é que vão para a bancada molhada à medida em que entram para dissolução na água.

 

8 – Meio ambiente

Se você tem um laboratório caseiro e processa apenas as próprias fotografias, por mais que você fotografe, certamente não atinge o volume mínimo para precisar ser monitorado por algum órgão de controle ambiental. Muitos dos reagentes usados em fotografia entram em produtos de limpeza e até alimentos e você pode descartar os banhos normalmente, pelo esgoto, assim como faz como a limpeza da casa. Se precisar descartar reagentes em forma pura aí é melhor, mais por cidadania do que por qualquer outro motivo, procurar um descarte profissional. Entre em contato com o seu fornecedor e ele lhe orientará nesse sentido. Para procurar na web, algumas palavras chave seriam “logística reversa” ou “descarte de produtos químicos”. Mas você provavelmente verá que é mais fácil comprar pequenas quantidades do que se livrar delas.

9 – Conclusão

A pergunta final é se vale a pena se dar ao trabalho de preparar suas próprias fórmulas. Vamos então a um balanço final:

  1. QUALIDADE – Fórmulas de fabricantes são melhores que a mesma fórmula produzida em casa. Isso é um fato e não dá para escapar. Mas você não precisa fazer apenas fórmulas de grandes fabricantes e a diferença de qualidade e regularidade não é também nada terrível.
  2. TRABALHO – Além do trabalho em produzir as fórmulas, que não é grande mas é bem maior do que o de abrir um frasco de revelador pronto comprado no comércio, você certamente gastará mais tempo fazendo testes por conta de oscilações de um preparo a outro, de um fornecedor de reagente a outro e variações que você mesmo irá inventar de experimentar. Se você não quiser fazer testes e preferir ir logo colocando o seu filme no revelador que nunca usou antes, com reagentes que nunca experimentou antes, saiba que as chances de acontecer uma tragédia são pequenas e as variações provavelmente cairão dentro da latitude de acomodação do processo como um todo. Eu normalmente arrisco. Já terminei com negativos muito suaves ou muito densos mas nada que me assustasse para começar a testar cada nova fórmula ou ingrediente. Se você encara a coisa como um desafio e se diverte bem com o processo, então essa desvantagem se transforma em vantagem. É claro que isso só vale para o amador, o profissional deve usar de todos os meios para garantir o resultado final.
  3. CUSTO – Provavelmente custa menos fazer em casa. Depende de onde você compra, o que você compra e quanto consome. Mas principalmente por conta da importação e impostos os preços de químicas prontas da Kodak, Ilford e outros fornecedores internacionais é muito alto. Se quiser estimar e comparar, veja aqui uma calculadora que o ajudará a encontrar com precisão o custo de uma solução de trabalho qualquer para qualquer processo fotográfico. A partir de um orçamento dos reagentes básicos que você pode fazer online, calcule quanto irá custar cada litro de solução de trabalho.
  4. FLEXIBILIDADE – Enorme vantagem para a opção caseira. Você pode experimentar variações sem fim, fórmulas de hoje e de ontem, soluções adaptadas ao seu filme ou qualquer outra idiossincrasia. Em pouco tempo aprenderá o efeito de cada reagente na composição dos reveladores (os mais interessantes) e estará fazendo as suas próprias versões. Alguns fotógrafos, ao longo da história, com maior ou menor ou nada de conhecimentos em química (a fila de diletantes começou com os próprios Niépce e Daguerre), desenvolveram fórmulas que foram adotadas por uma larga comunidade com a qual você poderá conversar e interagir nos muitos fóruns na web.
  5. INDEPENDÊNCIA – Novamente, a vantagem está nos processos caseiros. Esses reagentes não são exclusivos da cambaleante indústria da fotografia analógica e provavelmente sempre estarão no mercado.

Bem, tudo somado, é preciso gostar. Se você gostar e se dedicar certamente ficará satisfeito com os resultados.

10 CommentsLeave a comment

  • Oi Wagner, tudo bom? para fixador você usa o hipossulfito de sódio P.A. ou comercial? Abraço e parabéns pelo site.

    • Olá, eu uso P.A., mas acredito que não faria muita diferença usar o comum. É mais por inércia e por que em geral compro com outras coisas em sites/lojas que oferecem o P.A.

    • Para obter a foto você tem normalmente duas etapas: o negativo e depois o positivo. O negativo é o filme que vai na câmera, para revelar o negativo você pode usar o D23. Para depois ampliar em papel fotográfico você usa o D72. Os reveladores de papel são em geral muito fortes para o filme, é por isso que normalmente se utilizam dois diferentes.

  • Olá Wagner, já faço em casa o Parodinal com Tylenol e Sulfito de sódio, faço o Interruptor com ácido cítrico e o fixador Kodak F24. Gosto muito deles é os meus resultados são excelentes para filmes. Gostei bastante do seu artigo e qualquer dia passo para o papel.

  • Boa noite, todos esses quimicos citados são reutilizaveis? Qual a quantidade filmes/papeis podem ser revelados a cada litro de reveladores/fixadores/interruptores etc

    • Olá, eu vou incorporar esses dados no post e te aviso. Grato por perguntar pois me ajuda a melhorar o conteúdo.

    • Infelizmente não, eu nunca tentei fazer nada colorido. Sei que até dá para revelar o filme mas depois para imprimir em papel colorido é muito complicado.

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