Beau Brownie nº2 | Kodak

Mais uma câmera da longa série das Brownies. A primeira apareceu em 1900, mas este é o modelo Beau Brownie e foi lançado em outubro de 1930 e ficou 3 anos em produção. A sua marca distintiva é o design art-deco realizado por Walter Dorwin Teague. Foi fabricada em tons de preto, azul, rosa, verde e marrom. Teague foi um dos primeiros designers nos Estados Unidos a assumir que além da funcionalidade a estética de um produto de consumo era algo a que as pessoas dariam valor. É interessante que antes da Revolução Industrial, quando mobiliário, vestuário e utensílios domésticos estavam ao cargo de artesãos em processos laboriosos e caros, a produção destinada a aristocratas e burgueses abastados sacrificava facilmente a funcionalidade ou ergonomia em favor de apresentar um resultado estético imponente.

Nesta página da Enciclopédia de Diderot e D’Alambert, de 1765, que ilustra peças de faiança, temos exemplos que dispensam maiores explicações. Mas principalmente a partir do início do século XX a indústria inclinou-se para uma união de design atraente, segundo a estética do momento, controle do custo de produção e funcionalidade no uso. Podemos dizer que as primeiras Kodak Brownie estavam mais orientadas à questão de custo e funcionalidade. Eram câmeras simples e muito confiáveis, mas eram apenas caixas que quando muito ofereciam alternativas de algumas cores para o comprador escolher. Mas na década de 30, talvez até em função da crise financeira que encolhia os mercados, a Kodak resolveu dar um atrativo a mais para suas box cameras e assim nasceu, entre outras, a nº2 Beau Brownie.

Walter Dorwin Teague

Walter Dorwin Teague foi apresentado à Eastman Kodak Company pelo então curador do The Metropolitan Museum of Art, em Nova Iorque e desenvolveu muitos projetos para a empresa dentro de um estilo Art Deco que hoje é muito valorizado por colecionadores. Mas a ideia de produzir câmeras com estética própria, “na moda”, não teria o sucesso que teve se Teague não soubesse também dialogar com os engenheiros, analisar custos e conciliar suas ideias criativas com as necessidades técnicas e de mercado na concepção de cada câmera.

Acima estão designs que ele desenvolveu durante os anos dessa colaboração. As Beau Brownie, que significa Bela Brownie, pois beau é belo em francês, aparecem em suas cores disponí­veis no centro e embaixo na foto.

Sobre a nº 2 Beau Brownie

A câmera utiliza filme em rolo no formato que usa o código 120. Saliento que é só um código pois já vi muitos novatos em fotografia analógica dizerem “120 milímetros”, mas não é esse o caso. A largura da tira de filme é de 2 ¼” ou 57mm. Formato muito conveniente pois ainda é fabricado. É impressionante a sua longevidade pois foi lançado em 1901, junto com as primeiras Brownies, e é ainda produzido até os nossos dias pois foi adotado como filme padrão em médio formato e equipa câmeras como Hasselblad, Pentax, Bronica, Ikonta, Bessa, Rolleiflex, Bronica e Mamiya, entre outras. O negativo da Beau Brownie tem as dimensões 2 ¼ x 3 ¼”, ou 57 x 82 mm, arredondados. É um tamanho que permite cópias por contato, isto é, impressões sem o uso de um ampliador, pois já permitem uma boa visualização em algo como a palma da mão. Muitos álbuns de famí­lia antigos estão repletos de fotografias nesse tamanho ou semelhante, como o formato quadrado, ainda mais popular, 2 ¼ x  2 ¼”. Com frequência essas fotos têm uma margem branca e opcionalmente a borda é “picotada”.

Por ter o quadro retangular e utilizar visores para enquadramento, dois visores estão presentes para permitir orientações retrato e paisagem. São visores muito pequenos formados por duas lentes e um espelho a 45º. Não é muito fácil se enxergar o que se está fotografando conforme a luz ambiente. No geral escolhe-se o que vai ficar no centro e temos uma noção mas não um controle muito apurado do que está enquadrado nos cantos. Outra característica não muito fácil de se lidar é que a imagem aparece invertida direita x esquerda.

Visor no modo retrato

A velocidade é uma só, por volta de 1/40s, ou então pode-se usar Bulb e o obturador fica aberto pelo tempo em que se mantiver a alavanca do disparador abaixada. Não há conector para disparo por cabo.

A lente é dupla, dois meniscos que parecem simétricos em relação ao diafragma. Mas não achei isso documentado para ter certeza. Medindo-se do diafragma até o filme temos uma distância focal de ~100 mm. Isso dá um ângulo de visão de 45º no lado maior, 32º no lado menor da imagem e 53º na diagonal. É portanto uma lente que podemos chamar de normal. Porém, eu suponho que por conta de aberrações não corrigidas os cantos esticam a imagem e dão a sensação de que temos uma lente mais angular.

Para abertura temos 3 opções com um diafragma deslizante. Calculo que essas aberturas sejam  f/11, f/16 e f/22, pois a maior pupila de entrada mede algo como 9mm e suponho que os diafragmas seguintes cortem a exposição ao meio como é padrão em fotografia. Com filmes modernos isso significa que fotos externas em dia claro ou mesmo nublado são muito fáceis sem precisarmos “puxar” na revelação. Para uso com tripé a câmera possui roscas 1/4″ em posições paisagem ou retrato. Mas, sem cabo disparador, isso fica mais difícil de se usar.

Este exemplar da coleção foi comprado em Bièvres em 2023, veio sem a alça mas, por sorte, eu tinha um pedaço de couro em tonalidade próxima do marrom da pintura e por isso consegui uma reposição razoável. Ela veio empoeirada por dentro. Para abrir basta remover dois preguinhos que ficam camuflados pela pintura nas laterais da parte frontal. Removendo-os o painel sai inteiro. Isso dá acesso total ao elemento óptico frontal e ainda é possível se limpar o traseiro enquanto se mantém o obturador aberto em B. Também o obturador fica exposto mas a câmera é toda montada com pregos e rebites, não vi nenhum parafuso, isso dificulta muito para desmontar o mecanismo se algum problema mais sério estiver ocorrendo. De resto ela é muito simples como todas as Brownies.

Abaixo algumas fotos que fiz com ela. São scans de impressões em papel fotográfico em 13×18 cm, as duas primeiras, e 18×24 cm a última. O filme era ISO 100. O divertido em se usar uma câmera como essa é que o desafio reside em achar uma cena na qual ela possa se dar bem. É preciso se escolher um dia claro e um assunto a pelo menos uns 3 metros de distância.

Esta foto foi feita com f/22 e câmera na mão. Eu cortei um pouco à direita pois a proximidade e mais as aberrações estavam deteriorando muito a imagem.

Esta foto me surpreendeu pelo contra luz. Quando fiz achei que daria muito mais ofuscamento. Precisei dar um pouco de burning no canto esquerdo em cima, mas a meu ver veio uma cópia muito aceitável. Cortei um pouco na parte de baixo pois eu não quis inclinar a câmera e com ela na horizontal vinha muito chão. A abertura foi f/16.

Este é um negativo inteiro e a abertura foi f/22 com câmera na mão. Passo por esse lago com muita frequência. Esperava um dia em que o sol desse um destaque especial para os “cisnes” deixando o resto mais no escuro. Eles se mexem no lago, conforme a correnteza. Esperava também um dia em que a luz e a posição deles permitissem essa visão em meio perfil com todos alinhados. No dia em que fui experimentar a Beau Brownie as condições meteorológicas e estelares estavam favoráveis e eu pude fazer essa foto que para mim tem um certo valor afetivo por eu já ter feito deliciosas caminhadas nesse local.

No geral, gostei de usar a Beau Brownie e penso em sair com ela mais vezes. Acho que tem muito do gosto de se usar uma câmera vintage e tão simpática, mas as imagens que ela produz não decepcionam se as condições de assunto x luminosidade estiverem favoráveis.

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