Olympus Trip 35 | Olympus

Esta é uma câmera realmente icônica de uma era. Foi lançada em 1967, fabricada até 1984 e vendeu 10 milhões de exemplares. Segundo a camera-wiki, nessa contagem estão incluídas as versões mais recentes com o corpo feito em plástico. Mas, mesmo assim, a versão original em metal, foto acima, passou a marca dos 5 milhões de unidades.

A razão desse sucesso está realmente no projeto em si. Em fotografia é muito presente o princípio de que toda vez que se ganha de um lado perde-se de outro. Dessa forma cada câmera, vista como uma combinação muitos parâmetros de óptica, regulagens de exposição, funcionalidades, etc segue a regra básica de que muitos recursos encarecem exponencialmente o preço final e tornam a operação significativamente mais complexa. Nesse extremo perde-se a maior parte do público consumidor que não aceita ficar na dependência de horas de estudo de todas as variáveis envolvidas no processo fotográfico. Por outro lado, câmeras muito simples, tendem a oferecer um campo de aplicação restrito, produzindo imagens satisfatórias apenas em pouquíssimas situações. A Olympus Trip 35 é uma combinação extremamente feliz de parâmetros que otimiza a versatilidade mantendo a sua operação extremamente simples.

Ela produz um negativo no formato clássico de 36x24mm em filme 35mm. Neste ponto, embora esteticamente parecida, é bem diferente de outro sucesso da Olympus que é a Olympus Pen, uma câmera de meio quadro 24x18mm.

É uma câmera para ser usada no automático. Possui um fotômetro de selênio, sem bateria, que fica em volta da lente. Esse fotômetro é posicionado de tal forma que a adição de um filtro proporciona uma leitura automaticamente corrigida pois o filtro cobre lente e fotômetro ao mesmo tempo . Baseada na leitura da luminosidade da cena a Olympus Trip 35 escolhe entre duas velocidades apenas: 1/40 ou 1/200s, e aberturas que vão de f/2.8 até f/22.

Com essas possibilidades são viáveis fotografias de interiores bem iluminados até paisagens ensolaradas usando-se filme ISO100. Com ISO400, com revelação normal, mesmo as cenas com luzes mais fracas ainda podem render bons negativos.

É possível também um modo manual especificando-se uma abertura qualquer. Nesse modo a velocidade é sempre 1/40s.

A lente não é intercambiável. Sua distância focal é de 40mm o que a torna um pouco mais angular que uma lente normal que seria 50mm. É ótima para grupos em locais mais apertados, paisagens e fotografias de rua, indiscretas, sem nem mesmo se utilizar o visor. O tamanho do negativo dá liberdade para alguns cortes posteriores para se ajeitar a composição. Quanto à óptica, ela tem 4 elementos em 3 grupos e segue o conceito da famosíssima Tessar, uma lente simples mas famosa por ser extremamente nítida para seu tipo de construção.

Não se pode esperar uma performance maravilhosa dessa lente/câmera. Já começa que em 1/40s, sem tripé, é quase certa alguma tremida da câmera. Além disso o foco por zonas não é preciso como em uma câmera com telêmetro ou reflex e não se pode esquecer que é uma câmera amadora. Para ampliações modestas funciona bem na grande maioria das vezes e em várias ocasiões ela até surpreende positivamente. A foto acima, eu fiz achando que daria muito mais flare, mas foi possível se obter uma imagem que considero bem agradável, com um nível de flare que não compromete e até produz uma atmosfera condizente com a imagem.

O foco é o ponto onde a Olympus rompeu com o óbvio e foi muito feliz ao fazer isso. Não sendo uma reflex e não possuindo um telêmetro (rangefinder), o natural seria, como sempre se fez, colocar-se uma escala de distâncias em metros e/ou pés.

Mas, em vez disso, considerando que provavelmente a maioria dos fotógrafos amadores não se sentem seguros em estimar essas distâncias, uma escala com apenas 4 posições apresenta a questão de maneira muito inteligente: você quer fotografar um busto? Alguém de meio corpo? Um grupo?  Uma paisagem? Os quatro ícones são auto explicativos e resolvem de maneira intuitiva a questão do foco. Correspondem a 1,o, 1,5, 3,0 metros e infinito. Com abertura máxima em f/2.8, a profundidade de campo termina por dar uma nitidez satisfatória na maioria esmagadora das fotos utilizando-se esse padrão.

O visor possui uma moldura brilhante para indicar o enquadramento. Considerando que a lente toma a foto de uma posição diferente do visor, nos casos em que o assunto estiver muito próximo é preciso se considerar essa diferença.

Para isso o visor mostra marcas que posicionam o quadro um pouco abaixo e um pouco à direita. Essas marcas devem ser consideradas nessas situações. Veja acima uma foto do manual da Olympus Trip 35.

Essa área vermelha no visor não é parte do design gráfico do manual anos 60 . É na realidade um dispositivo de segurança para se evitar sub-exposição da foto. Toda vez que pelo ISO do filme for necessária uma abertura maior que f/2.8 e velocidade mais lenta que 1/40s uma lingueta vermelha sobe no visor e a câmera não dispara. Se o fotógrafo quiser, mesmo assim, fazer a tomada, ele tem a opção de usar a abertura que quiser indo para o modo manual.

Nos casos de um objeto bem iluminado contra um fundo escuro, quando a trava de segurança pode ser ativada por parecer uma sub-exposição, é possível “enganar” o fotômetro alterando-se o ISO indicado para um valor maior. A foto poderá ser assim liberada e, com um pouco de sorte, o assunto virá com boa exposição.

Esta é a aparência do visor, fotografado com um celular. Note que o tubo da lente aparece no canto direito inferior. Esse é um problema comum em câmeras de visor pois este fica muito próximo da lente. Mas a Olympus soube tirar proveito disso e colocou a escala de distâncias em uma posição que fica visível e pode-se dar uma última conferida ante de clicar.

O avanço do filme não é por alavanca, como na maioria das outras câmeras. É um rolete na traseira da câmera à direita do visor. O contador de poses fica no topo da câmera, bem como o seu número de série. A Olympus Trip oferece uma sapata quente para sincronismo de flash em modos M ou X. Mas tem também, no painel da frente, um conector padrão para flash. À esquerda da sapata está o rebobinador para voltar o filme para dentro de seu tambor quando a última foto for tirada.

É muito divertido se usar um flash bulb com a Olympus Trip 35. Existe um Olympus Pen Flash do tamanho de uma caixinha de fósforos e que aceita flash bulbs AG-3N. A bateria é mais difícil de se encontrar pois é uma de 15V, somente casas muito especializadas ainda distribuem esse tamanho. Mas é possível se adaptar as muito comuns baterias de 12V tipo A23 que são menores. Se o capacitor não estiver mais funcionando será preciso substituí-lo também. Mas não é difícil se fazer isso.

Aqui vai um exemplo sem e com flash bulbs para encher um pouco as sombras mas sem deixar a luz muito artificial

Neste caso abaixo também usei flash bulb AG-3N com modo manual em f/22.

A ideia foi compensar o contra luz da rua e achei que funcionou bem. Sem o flash os rostos viriam com uma sombra muito forte, ou parte da rua viria super exposta.

 

Na base da câmera está a trava para liberar o filme para que seja rebobinado e um soquete para tripé no padrão 1/4″. A rosca do filtro é 43,5mm

O ideal mesmo, quando câmera e fotógrafo ficam felizes, parece estar em fotos com boa iluminação e objetos situados de 3 a 5 metros de distância. Esta foto da bicicleta tem um bom corte, contraste e detalhes nas sombras e altas luzes dentro de um bom equilíbrio. O filme foi um Agfa APX100.

Com tanto sucesso a Olympus Trip 35 teve uma presença marcante na propaganda. Abaixo dois anúncios que são muito diretos ao explorar a posição de líder de mercado no segmento e dizer aquilo que o consumidor quer ouvir. Desde a Kodak Brownie nº2, lançada em 1901, sabe-se que o fotógrafo amador quer registrar suas viagens, família e amigos. O nome Trip, que significa viagem em inglês, já introduz o conceito. Depois o texto explora a facilidade de uso, a certeza da boa exposição com a trava vermelha, qualidade óptica. Muito fácil fazer propaganda de um produto tão bom!

Aqui um anúncio da importadora Tropical Ltda, que a distribuía Olympus aqui no Brasil. Já não se nota o mesmo cuidado com o posicionamento. Não é uma câmera para quem “pensa seriamente em fotografia” e, pior ainda, ela não tem “foco automático”. Mas, enfim, era o distribuidor exclusivo, a se crer no anúncio.

Vendendo aos milhões, a Olympus Trip 35 pode se dar ao luxo até de fazer campanha na televisão. Abaixo um comercial bem humorado onde um fotógrafo antiquado, ainda usando uma view camera para fazer uma foto de casamento, é surpreendido por um jovem usando uma Olympus Trip 35. A graça é que ele diz que com aquela câmera o jovem jamais seria um profissional, porém, tratava-se de David Bailey um fotógrafo britânico que era uma celebridade na época, conhecido popularmente. Conta-se até que para o filme Blow-Up, de Antonioni, cujo artista principal é um fotógrafo de moda, o diretor inspirou-se no personagem real, David Bailey, para criar o papel interpretado por David Hemmings.

Hoje, mais de 50 anos depois de seu reinado, a Olympus Trip tornou-se uma queridinha dos iniciantes nesse renascer da fotografia analógica. Ela foi em sua época a câmera de entrada, ou câmera da família e dos amadores em geral. Creio até que a Olympus, com a Trip e a Pen, ficou tão marcada como a marca de câmeras amadoras nos anos 70 que isso prejudicou a expansão de sua excelente linha de monoreflex OM entre profissionais. Mas não se pode esquecer que desde o princípio ela já gozava de uma aura de câmera cult. O próprio David Bailey de fato a usava, entre muitas outras, é claro, em sua produção autoral. Martin Parr foi outro que explorou a praticidade e confiabilidade da Trip para centenas de suas fotografias documentando momentos bizarros em instantâneos de rua. Don McCullin, Daido Moriyama, William Eggleston, Tony Ray-Jones e muitos outros ajudaram a fazer a fama da Olympus Trip.

O que está por trás disso tudo é o fato de que versatilidade, aquela câmera capaz de fazer todo tipo de fotografia, em qualquer situação, não corresponde à realidade. Praticamente nenhum fotógrafo faz de tudo. Até existiram câmeras com essa pretensão. Para mim o exemplo clássico é a maravilhosa linha das Linhof Technika. Seu posicionamento era justamente fazer de tudo. Mas isso a tornava lenta e pesada para um fotógrafo de moda, limitada para um fotógrafo de arquitetura, indiscreta para um fotógrafo de rua, complicada e cara demais para o amador e assim por diante. A Olympus Trip é ótima, como foi dito acima, para cenas bem iluminadas e assunto entre 2 e 5 metros de distância. Se o gênero de fotografia que se pretende se encaixa bem nesse espaço, então ela é perfeita.

Em resumo, se a câmera é bem construída, se é confiável, e se para o gênero de fotografia que o fotógrafo realiza ela fornece o mínimo de controles, nem mais nem menos, então ela é uma ótima câmera para esse fotógrafo. A Olympus Trip 35 foi exatamente isso para uma legião de amadores, artistas e até profissionais.

 

 

 

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